sábado, 18 de outubro de 2008

Em Porto Alegre, eu vou de Ônibus

Eu sou um usuário do transporte coletivo de Porto Alegre.

Depois de 6 anos viajando de carro para ir trabalhar, resolvi mudar meu comportamento e adotar uma postura mais ecológica (e econômica): a ida e a volta para o trabalho é de transporte coletivo ( ônibus ou lotação).

Para quem não é de Porto Alegre é bom esclarecer: lotação é um tipo de microônibus com linhas exclusivas, onde todos os passageiros vão sentados. As linhas de lotação atendem toda a cidade e são uma opção rápida e mais confortável que o ônibus.

Mas eu tenho andado mesmo é de ônibus! E sou um usuário muito satisfeito.
Minhas viagens do bairro Menino Deus ao bairro Moinhos de Vento (às vezes passando pelo centro) são tranqüilas e acompanhadas de belas poesias.

Isto mesmo: poesia!

A Prefeitura de Porto Alegre há muito tempo incentiva a cultura. Já está na sua 16º edição o Projeto Poema no Ônibus. Tenho que admitir que, por não ter o costume de andar de ônibus, fiquei um pouco mais pobre de espírito. Mas prometo recuperar todo o tempo perdido e aproveitar cada viagem para ler e até, quem sabe, decorar alguns poemas.

Seguem três que escolhi e que são meus favoritos:

Estagiário

Tempo inimigo Zombeteiro,Não facilitador, ingrato
Quando se acha que realmente aprendeu alguma coisa,
Acabou o contrato.

Eduardo Morais

Dias melhores verão

desfruta sem pressa essa tua primavera
quando o verão chegare fores fruto maduro
vou te colhercom apuro
e te comer
de colher

Germana Konrath

Tempo abandonado

Já reparou quanta poesia há num relógio parado?
Um relógio estragado é uma afronta, um protesto
Contra o tempo inventado pelos homens
Um relógio parado desafia a velocidade.
Um ponteiro estático não marca o tempo
Marca permanência. Exerce eternidade.
O trágico silêncio dos ponteiros
É uma elegia às horas mortas
Cada ato de um relógio estragado
Desassossega o efêmero.
Um relógio inútil desafia todos os minutos
Ilude o atraso, dói o tempo...
Um tempo morto, esquecido abandonado.

Jéferson de Souza Tenório

Com poesia tudo fica mais fácil.

Então...Vamos em frente! De ônibus!

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O touro e a bolsa

Mercados financeiros em todo o mundo reagem como um animal em fúria à ineficiência da gestão americana.

Ficou fácil entender porque o símbolo de Wall Street é um touro!
Símbolo, aliás, bem adequado: o nome da escultura feita pelo nova-iorquino Arturo di Modica é "Charging Bull" (ou “touro em ataque”, em português).

Até o momento, foram mais de 19 bancos que quebraram nos Estados Unidos e 5 na Europa. Alguns deles serão comprados por valores muito abaixo do que valem. A “farra” do crédito fácil e ilimitado está tendo um fim trágico.

Mas será que esta historia já acabou? Para alguns, setembro de 2008 está sendo mais devastador e será tão inesquecível quando foi setembro de 2001.

Só que desta vez existe um Bin Laden em cada esquina e em cada parque americano. Alguns desempregados, morando dentro de carros e apenas com a roupa do corpo.

Eles são os tomadores de empréstimos que não honraram os seus pagamentos e transformaram as carteiras de crédito hipotecário na maior “massa podre” da história do capitalismo nos últimos anos.

Alguns analistas da crise dizem que ela é momentânea e que com a eleição do novo presidente e mais uns ajustes no sistema financeiro o mercado volta para a normalidade e a vida continua.

Outros, no entanto, defendem que este é o fim da supremacia econômica da América.

Quem viver verá.

Vamos em frente.

domingo, 5 de outubro de 2008

Veríssimo e a nossas opções

Achei este texto muito legal. É do Luis Fernando Verissímo sobre os caminhos e opções que escolhemos.

" Vivemos cercados pelas nossas alternativas, pelo que podíamos ter sido. Ah,se apenas tivéssemos acertado aquele número (unzinho e eu ganhava a sena acumulada), topado aquele emprego, completado aquele curso, chegado antes,chegado depois, dito sim, dito não, ido para Londrina, casado com a Doralice, feito aquele teste...

Agora mesmo, neste bar imaginário em que estou bebendo para esquecer o que não fiz - aliás, o nome do bar é Imaginário -, sentou um cara do meu lado direito e se apresentou:

- Eu sou você, se tivesse feito aquele teste no Botafogo.

E ele tem mesmo a minha idade e a minha cara. E o mesmo desconsolo.

- Por que? Sua vida não foi melhor do que a minha?

- Durante um certo tempo, foi. Cheguei a titular. Cheguei à seleção. Fiz um grande contrato. Levava uma grande vida. Até que um dia...

- Eu sei, eu sei... - disse alguém sentado ao lado dele. Olhamos para ointrometido... Tinha a nossa idade e a nossa cara e não parecia mais felizdo que nós. Ele continuou:

- Você hesitou entre sair e não sair do gol. Não saiu, levou o único gol do jogo, caiu em desgraça, largou o futebol e foi ser um medíocre propagandista.

- Como é que você sabe?

- Eu sou você, se tivesse saído do gol. Não só peguei a bola como me mandei para o ataque com tanta perfeição que fizemos o gol da vitória. Fui considerado o herói do jogo. No jogo seguinte, hesitei entre me atirar nos pés de um atacante e não me atirar. Como era um herói, me atirei... Levei um chute na cabeça. Não pude ser mais nada. Nem propagandista. Ganho uma miséria do INSS e só faço isto: bebo e me queixo da vida. Se não tivesse ido nos pés do atacante...

- Ele chutaria para fora. - quem falou foi o outro sósia nosso, ao lado dele, que em seguida se apresentou:
- Eu sou você se não tivesse ido naquela bola. Não faria diferença. Não seria gol. Minha carreira continuou. Fiquei cada vez mais famoso, e com fama de sortudo também. Fui vendido para o futebol europeu, por uma fábula. O primeiro goleiro brasileiro a ir jogar na Europa. Embarquei com festa noRio...

- E o que aconteceu? - perguntamos os três em uníssono.

- Lembra aquele avião da Varig que caiu na chegada em Paris?

- Você...

- Morri com 28 anos.

- Bem que tínhamos notado sua palidez.

- Pensando bem, foi melhor não fazer aquele teste no Botafogo...

- E ter levado o chute na cabeça...

- Foi melhor - continuei - ter ido fazer o concurso para o serviço público naquele dia. Ah, se eu tivesse passado...
- Você deve estar brincando! - disse alguém sentado a minha esquerda. Tinhaa minha cara, mas parecia mais velho e desanimado.

- Quem é você?

- Eu sou você, se tivesse entrado para o serviço público.

Vi que todas as banquetas do bar à esquerda dele estavam ocupadas porversões de mim no serviço público, uma mais desiludida do que a outra. As conseqüências de anos de decisões erradas, alianças fracassadas, pequenas traições, promoções negadas e frustração. Olhei em volta. Eu lotava o bar.Todas as mesas estavam ocupadas por minhas alternativas e nenhuma parecia estar contente.

Comentei com o barman que, no fim, quem estava com o melhor aspecto, ali,era eu mesmo. O barman fez que sim com a cabeça, tristemente. Só então notei que ele também tinha a minha cara, só com mais rugas.

- Quem é você? - perguntei.

- Eu sou você, se tivesse casado com a Doralice.

- E...?

Ele não respondeu. Só fez um sinal, com o dedão virado para baixo...

Creio que a vida não é feita das decisões que você não toma, ou das atitudes que você não teve, mas sim, daquilo que foi feito. Se bom ou não, penso, é melhor viver do futuro que do passado.

Verdadeiro.Vamos em frente!